30/05/2008

Cuba passa por algumas transformações

Cuba passa por algumas transformações. É claro, tudo se transforma, nada é parado, nos ensina a dialética. Até os EUA passam por transformações, que, no caso, envolvem uma crise econômica e moral profunda. Mas as transformações em Cuba nada têm a ver com um retorno ao capitalismo (para a frustração dos mafiosos de Miami). Pelo contrário, a superação de grandes dificuldades econômicas provocadas pelo bloqueio imposto pelo governo “americano” e pelo fim do apoio recebido do bloco socialista é a superação de uma fase, conhecida como “período especial”. Para isso contribuíram alguns apoios externos, como da Venezuela, da China e até do Brasil, com o envio de petróleo e turistas a um preço camarada. É mais barato passar uma férias em Cuba do que em um hotel médio de Salvador, por exemplo. E a questão energética está sendo resolvida, não só com petróleo venezuelano, mas com produção própria – é verdade que ainda pequena mas crescente e com grande potencial, com auxílio, inclusive, da Petrobras – e com sistemas de economia de energia. A substituição de lâmpadas incandescentes por lâmpadas a gás, por exemplo, resultou em uma economia substancial, de forma que agora é possível, ao cubano comum, ter novos eletrodomésticos, como geladeiras mais eficientes. Até telefones celulares estão se tornando populares, não por estar havendo alguma abertura para o capitalismo, mas simplesmente pelo crescimento econômico. E computadores, se os cubanos não os têm mais é pela dificuldade de acesso, controlado pelos “americanos”. O crescimento do PIB cubano foi um dos maiores da América Latina, nos últimos anos (da ordem de 12%), mas o PIB não significa muita coisa: apenas o tamanho geral da economia (envolvendo até o tamanho dos desperdícios e ações anti-sociais, comuns nos países de grande PIB), mas não a qualidade dessa economia. E é na qualidade que Cuba mais se destaca. A qualidade de vida, que envolve a igualdade de oportunidades, a saúde, a educação, a cultura, os esportes, tem em Cuba um máximo se compararmos com quase todos os países do mundo. O IDH – Índice de Desenvolvimento Humano de Cuba também é um dos maiores da América Latina, mas também não reflete, como o PIB, a qualidade de vida. O IDH calculado pela CEPAL / ONU é baseado em três variáveis: saúde, educação e renda per capita. Ora, essa última variável apresenta problemas. Primeiro, como é uma média, não reflete a igualdade da distribuição da renda. Segundo, num país em que o Estado fornece educação e saúde de boa qualidade sem que o cidadão tenha que pagar com sua renda individual; onde a moradia (aluguel) representa parcela muito pequena da renda; onde as atividades culturais, esportivas e de lazer são abertas a todos, em geral de graça, a renda per capita não tem o mesmo sentido que tem em países onde o cidadão tem que pagar por tudo com o seu salário. Assim, se expurgarmos do cálculo do IDH essa variável da renda, não há dúvida de que Cuba teria um dos maiores IDH não só da América Latina, mas do mundo.
Se adotarmos o conceito de qualidade de vida dominante nas sociedades capitalistas, de que o importante é ter coisas, consumir luxo, ostentar riqueza, desperdiçar recursos, então é certo que Cuba não tem essa qualidade. É um país pobre, sabotado pelo Império, e não pode ter esse tipo de qualidade. E nem quer, pois se orgulha de ter uma racionalidade econômica voltada para o social, para um desenvolvimento pleno do indivíduo dentro do social.
Existe, ainda, a crítica de que esse desenvolvimento exigiu características capitalistas da economia: empresas estrangeiras controlam hotéis turísticos, por exemplo; admite-se que algumas pessoas tenham lucro; o investimento externo é bem vindo e, é claro, está associado a uma remessa de lucros; o turismo e os dólares vindos dos cubanos residindo nos EUA são um ingresso significativo. Algumas características capitalistas não constituem um capitalismo. No socialismo em estágio inicial, de implantação, é necessária uma fase de adaptação. Não vamos aqui analisar o socialismo de mercado dos chineses, ou a Nova Política Econômica de Lênin, pois são coisas distintas. O que importa, é que são adaptações sob controle de um Estado com planejamento central que libera ações descentralizadas, empresariais, porém sob controle democrático.
Aqui entramos em outra questão: a da democracia. Acusam Cuba de estar conseguindo esse grande desenvolvimento, assim como a China, à custa de um sacrifício da democracia. Nada mais falso. A democracia cubana é simplesmente de qualidade diferente da democracia burguesa, onde o poder econômico de uma classe dominante minoritária dita os resultados das eleições, os conteúdos da cultura, da educação, do pensamento, pela manipulação dos mecanismos de formação das opiniões, pelo estímulo ao individualismo egoísta, pela alienação e enganação. Em Cuba as eleições são mais democráticas: não sofrem influência de qualquer partido; vota-se em pessoas conhecidas, que trabalham ou vivem com os eleitores, que não têm interesse em tirar vantagem pessoal. Destas, as eleitas reúnem-se em Assembléias do Poder Popular que escolhem, entre os eleitos pelo povo, os representantes nos níveis superiores de direção, até chegar à direção máxima, que naturalmente cabe aos grandes líderes. Dizem que há repressão aos opositores. Também isso é falso. Certamente há repressão a ações de sabotagem, a articulações comandadas e subvencionadas pelo Império, pois a revolução democrática tem que ser protegida. São inúmeros os atos de sabotagem, de terrorismo, de assassinatos e tentativas comandados pelo Império, além de todos os bloqueios que este exerce, econômicos, comerciais, culturais e de informação. Assim, cabe ao povo cubano manter a guarda. Quanto à liberdade de manifestar opinião, esta é total, desde que não articulada com as ações desestabilizadoras. E a opinião pública cubana é muito bem informada. A televisão e o rádio colocam todas as notícias e problemas políticos em discussão. O cubano tem sempre uma opinião a dar, um discurso a fazer, um texto a comentar. Certamente há os insatisfeitos. Por exemplo, em uma de minhas idas a Cuba, nas décadas de 80 e 90, sempre a serviço da ONU (ONUDI), encontrei no passeio da orla (o Malecón), um jovem muito insatisfeito, querendo emigrar. Reclamava que seu salário era muito baixo, e eu perguntei qual era seu trabalho. Ele me disse que era estudante, e eu tive que explicar que nos países capitalistas, em geral, o estudante paga para estudar, e não recebe um salário para isso. Enfim, existem alguns problemas de informação, ou de formação política, causados por uma descrença estimulada de fora, por uma ilusão de que lá fora tudo é melhor, veja as novelas brasileiras, que lindo, é tudo rico... Nós sabemos como é isso.

Ernesto
abril 2008

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