29/01/2010

Haiti – Muito além do horror

José Ernesto Alves GrisaMestre em Sociologia UFRGS - IFF

A dor do povo haitiano é inimaginável e imensurável.
Sobre a dramática situação do Haiti, é desumano ficar refém da cobertura das grandes redes de tv brasileiras. Primeiro, porque o relato falado pelos enviados não bate com as imagens geradas pela mídia internacional. Já no primeiro dia, ficaram batendo na tecla que o governo haitiano era incompetente em gerar estatísticas, número de mortos, os números se reiificam e são mais importantes que a dor.
Certamente, o Haiti não tem governo, tem uma tutela do imperialismo via ONU e, se tivesse, será que produzir estatísticas era o fundamental naquele momento? Desesperados, âncoras do jornalismo brasileiro tentam arrancar, literalmente, dos enviados, via telefone, informações sobre a violência e a insegurança instaladas, enquanto as imagens reproduzidas mostravam a população chorando, vagando, cantando seu canto de tristeza, as pessoas não praticavam nenhuma violência, elas eram as próprias vítimas da violência. No telejornal, desesperada, a âncora da rede Globo não queria saber sobre o sofrimento daquele povo e enfatizava que existiam relatos de saques e roubos a supermercados, quando, outra vez, as imagens mostravam os destroços de supermercados, os adultos removendo os escombros, numa operação arriscada, para ter acesso à água e alimentos para crianças e mulheres grávidas. Para a jornalista, seria melhor que os alimentos apodrecessem sem que a população pudesse ter esse acesso num momento de desespero?
Nos dois primeiros dias, só se via a população negra perambulando pelas ruas e não se viam os soldados das Forças de Paz, pois foi omitido que estas, inclusive a brasileira, estavam vigiando os bancos e as mansões dos magnatas brancos haitianos e estrangeiros, para evitar “violência dos negros bárbaros”. Só faltou dar-lhes, literalmente, este conceito. Esta não é uma manipulação da mídia brasileira, excepcionalmente, ela só reflete uma prática cotidiana, de como a população brasileira recebe o viés das notícias. Outra cena que dá para envergonhar os brasileiros, é o ridículo e patético Ministro da Defesa (dos ricos) Nelson Jobim fardado, fazer uma visita de menos de 24 horas ao Haiti, aliás, ficou mais tempo dentro do avião, que em solo haitiano, foi fazer o quê?
O Brasil é uma força de ocupação a mando dos Estados Unidos, sua função não é garantir a paz ou reerguer o país, mas sim, garantir a exploração e subjugação do povo haitiano. É necessária a ajuda humanitária, mas isso não se faz com soldados que são treinados para a guerra. São necessários médicos, enfermeiros, agentes sociais, como os que mandou Cuba.
É preciso deixar que os haitianos sejam donos de seu próprio destino, é necessária a saída das tropas de ocupação do Haiti. Não se escuta nos noticiários que boa parte dos bancos de sangue dos EUA são de sangue de jovens haitianos trocados por centavos de dólar, esta é uma exploração garantida pelas tropas brasileiras subservientes ao Pentágono, e este, para seguir garantindo a mão de obra barata, manda 10.000 soldados para garantir a “ordem” capitalista e sua exploração direta. Há muito cinismo nesta “dor” da mídia brasileira.

28/01/2010

“O papel da esquerda nessa eleição é não cair no jogo da engenharia política”

Membro da Direção Nacional do PCB, Mauro Iasi analisa os dilemas da esquerda para 2010

Por Júlio Delmanto

Dando continuidade à série “Eleições 2010”, a Caros Amigos entrevistou o doutor em Sociologia pela USP e professor da UFRJ Mauro Iasi. Membro da Direção Nacional do Partido Comunista Brasileiro (PCB), é autor de, entre outros livros, As metamorfoses da consciência de classe: o PT entre a negação e o consentimento, no qual analisa – à luz de Marx e Freud –o que seria, segundo o autor, o processo de adaptação do Partido dos Trabalhadores à lógica capitalista. Iasi esteve em São Paulo participando do Congresso Brasileiro de Estudantes de Comunicação Social (Cobrecos), onde concedeu entrevista sobre as perspectivas para as eleições presidenciais de 2010.

Caros Amigos - O que estará em disputa nas eleições desse ano?
Diretamente, o que acaba sobrando nessa disputa é determinado muito pela correlação de forças. Infelizmente, em 2010 o bloco conservador do Brasil está disputando a direção de um mesmo projeto, diferente de outros momentos em que havia uma polarização mais de fundo em relação a projeto. Em 2010 você tem um grande campo de consenso dentro do bloco conservador sobre os rumos imediatos da economia, sobre a imagem de futuro que se quer para o país e que foi se consolidando do mandato do Collor pra cá. Isso empobrece muito a discussão das eleições.
Esse consenso na macropolítica econômica, nos limites do possível, na ideia central de ajudar a acumulação capitalista no Brasil e, a partir desse desenvolvimento capitalista muito pontualmente incidir sobre a questão social como uma intenção de legitimar o desenvolvimento capitalista, empobrece muito, deixa ausente uma postura do campo popular, do campo de resistência. O que está em jogo também é a necessidade dos trabalhadores apresentarem propostas alternativas que consigam apontar os limites desse consenso.

Há alguma diferença entre os projetos de PT e PSDB?
Acho que há diferenças dentro de um campo em comum. Eles partem dos mesmos pressupostos, comungam da mesma leitura de Brasil, a ideia de que o desenvolvimento do país passa por um desenvolvimento capitalista e que o Estado brasileiro tem que desenvolver um forte apoio ao desenvolvimento do capitalismo monopolista no Brasil sem intervir diretamente no projeto econômico.
As diferenças entre esses dois campos acabam sendo das particularidades das construções partidárias de PT e PSDB e por onde eles podem se legitimar. Cada um tem uma ferramenta necessária à consolidação da ordem. Se a gente ler os textos do Banco Mundial a partir de meados da década de 90, a grande dificuldade de implementação do que se chamava de ajuste estrutural era não apenas controlar os organismos de governo, era criar consensos para legitimar de alguma forma o grande impacto negativo dessas reformas chamadas neoliberais. Esse texto afirma que os núcleos de resistência são as organizações de cúpula dos empresários, dos setores fisiológicos do congresso e de organizações dos trabalhadores. De certa maneira há uma divisão de trabalho aí, o PSDB tinha muito mais elementos para costurar essa governança conservadora junto às organizações de cúpula do empresariado e dos setores fisiológicos, por conta da aliança DEM-PSDB. Faltava exatamente incorporar essas organizações de cúpula dos trabalhadores para legitimar essa reforma, e o PT acaba cumprindo isso. Exatamente por essas funções diferentes dentro do plano geral do bloco conversador é que o PT precisa desenvolver uma estratégia de governo que busque se legitimar diante desses setores. Infelizmente, isso não faz com que se produza aí uma dinâmica dentro da qual o bloco popular consiga impor conquistas e demandas a esse governo. As diferenças não são suficientes pra retirar o governo Lula e o PT de dentro do bloco conservador.

Você acha que existe a possibilidade do PT se posicionar mais à esquerda para fazer essa diferenciação junto aos eleitores?
Pela dinâmica que está colocada nas eleições isso pode acontecer, mas muito pouco. As prioridades e as grandes preocupações do PT hoje são muito mais voltadas para atrair setores do PMDB que, ao que me consta, não são mobilizáveis por nenhuma inflexão mais à esquerda. Nos próprios movimentos sociais nós estamos pagando o preço dos últimos oito anos: como foi dado um voto de confiança ao governo, ele se sente muito tranqüilo para manter o pouco que deu até agora como meio de garantir esse apoio. De certa maneira, o governo trabalha com o entendimento de que esses setores estão neutralizados por conta da política desenvolvida, o diálogo com setores da esquerda é muito mais no sentido de ameaça, de perder o pouquíssimo que foi conquistado. É pouco provável que nesse momento o governo acene com uma inflexão mais à esquerda, como o apoio do PMDB é prioritário nesse momento a discussão tem sido feita de um ponto de vista muito menos programático.

E qual será o papel do Lula?
O Lula descolou-se da política brasileira, reproduzindo uma trajetória clássica na análise política. Ele vem como expressão da entrada em cena dos trabalhadores na década de 80 e faz parte do movimento que levará à formação do PT e da CUT como expressão dessa classe, mas pouco a pouco se descola disso, se tornando a figura clássica de uma liderança carismática que utiliza muito mais de seus atributos pessoais e de identificação direta da classe do que a organização com partidos e projetos políticos. Então, a popularidade e a aceitação do Lula e do seu governo é inversamente proporcional à própria força organizativa e programática do PT. Ele não cresce a partir do crescimento da organização própria e independente da classe mas pelo contrário, quanto mais ele cresce mais ele enfraquece isso, produzindo uma identidade pessoal com a figura do presidente e não com um projeto político.
Basta ver quantas vezes em dois mandatos a classe trabalhadora foi convocada, mobilizada, para tarefas de governo: nenhuma vez sequer. O governo optou por uma forma de construção política que na ciência política é chamada “presidencialismo de coalizão”, na qual as jogadas políticas são jogadas internas a esse critério palaciano dos bastidores. Os setores sociais raramente, ou nunca, são mobilizados para os enfrentamentos políticos. Então, o Lula acaba saindo do seu segundo mandato com uma popularidade alta, mas que não é transferível exatamente por ser colada na personalidade carismática do líder. O que se está tentando transferir é a luta de máquinas. O que beneficia o Lula é que as pessoas querem ter uma proximidade ao seu governo e isso facilita as alianças necessárias pra disputar as eleições, é isso que a Dilma leva de herança.

E como a esquerda deve se posicionar?
O papel da esquerda e dos movimentos populares nessa eleição é não cair nesse jogo do mero mecanismo e da engenharia política que acabou se cristalizando no Brasil. Nós estamos enfrentando o que poderia ser o final do primeiro governo popular numa total apatia, a discussão das eleições e das alternativas é meramente de nomes. O que seria fundamental é retomar a discussão programática, de que país precisamos, quais os limites desse modelo implementado e qual a perspectiva de futuro. Isso tem pouco espaço na engenharia da política eleitoral para 2010.

Mas você acha que essa retomada da discussão programática deve ser feita necessariamente através das eleições?
Infelizmente, parte do bloco de esquerda está capturada por essa forma conservadora das eleições, o que gera uma necessidade própria, de eleger deputado, de manter deputado... Isso necessariamente gera a necessidade de atingir coeficientes eleitorais, o que leva a alianças, o que faz com que cada vez o centro, que ao nosso ver seria o acúmulo programático, seja pouco a pouco substituído pela lógica das alianças meramente conjunturais, pela possibilidade de manter mandatos ou ampliar mandatos. Só isso que pode explicar, por exemplo, a aproximação, que agora parece pouco provável, entre o PSOL e a Marina Silva. E enquanto essas tentativas foram feitas, acabou se ocupando espaço da construção programática, o que faz com que agora a gente tenha pouco tempo, pois perdeu-se um tempo precioso.
É possível fazer esse acúmulo a partir das eleições? É, desde que você não pense as eleições de forma a cair nessa armadilha. Uma campanha nacional de partidos de esquerda, de movimentos sociais, que apresentasse uma crítica contundente e profunda a atual forma conservadora vigente e mobilizasse a população na defesa de seus interesses, cumpriria um papel mobilizador, esclarecedor, que permitiria aos trabalhadores recuperarem pouco a pouco sua independência. Apenas como uma forma de eleger um grupo de deputados para poder manter alguma máquina de mobilização para poder mobilizar para uma próxima eleição.

E tendo isso em vista, ainda há possibilidade da reedição da Frente de Esquerda (aliança entre PCB, PSOL e PSTU)?
A Frente de Esquerda hoje não está descartada, mas ela se atrasou muito por conta dessas indefinições que falávamos. No primeiro momento, a própria indefinição da candidatura da Heloísa Helena, o que abriu um vazio que deveria ser coberto exatamente por esse esforço de construção programática, mais do que a definição de um nome. A perspectiva da Frente de Esquerda no momento é muito pouca. Diante da indefinição de candidatura do PSOL, que de certa forma tinha uma boa perspectiva na pré-candidatura do Plínio Arruda Sampaio, vista com bons olhos na Frente mas que inexplicablemente a direção nacional não apostou nisso, deu inicio às negociações com o PV, e acabou se produzindo a candidatura do Zé Maria pelo PSTU. Nesse quadro, o PCB muito provavelmente lançará uma candidatura própria. Como a maior parte das convenções partidárias ocorrerá em março, isso pode se alterar se os partidos da Frente tiverem maturidade suficiente pra fazer dessa proposta uma discussão minimamente programática.

O curioso nessa aproximação de setores do PSOL com o PV é que eles parecem ter se esquecido de que o PV não tinha o menor interesse nessa aliança...
É, esqueceram de combinar com o PV... Pela lógica do PV, ele tem mais a perder do que a ganhar com uma aliança com o PSOL. O PV quer alguém que financie a sua campanha, o PSOL também, então do ponto de vista de estrutura de campanha a troca não seria benéfica para o PV. E eles tem menos problemas que os partidos de esquerda, pois como não partem de princípios muito sólidos, pode negociar com um campo muito mais amplo. Por ejemplo, no Rio de Janeiro ele vai para candidatura do Gabeira ao lado de PSDB e DEM. Em São Paulo ele se aproxima do PTB. Então, essas aproximações mostraram claramente o desenho político da candidatura da Marina Silva.
Nesse sentido, o PSOL fez um movimento difícil de compreender. A gente só pode entender essa aproximação com a Marina em cima da necessidade de obter uma campanha viável do ponto de vista do coeficiente eleitoral, para garantir a eleição de mandatos. É um movimento que eu vejo como errôneo, não só porque descaracteriza – acaba muito mais rapidamente do que a própria trajetória do PT mostrando uma adequação dos meios que acabam prejudicando os fins – mas também porque acho que do ponto de vista eleitoral é um equívoco.

Em 2006, o PCB apoiou Lula no 2º turno contra Alckmin. Na possibilidade muito provável de um 2º turno entre Dilma e Serra, qual será o posicionamento do partido?
A gente optou por votar no Lula contra o Alckmin, para depois permanecer na oposição a Lula. Essa é uma discussão que cada vez mais deve ser feita na política brasileira. O voto útil tem sentido diante da ameaça de um retrocesso, diante de uma luta de classes em que o setor centrista apresenta pelo menos a disponibilidade de uma negociação com uma abertura à esquerda. Não é o que nós temos visto. A Dilma é uma incógnita, ela é uma candidata que até agora teve uma trajetória praticamente burocrática, já entra direto no campo de governo, como administradora, e que ocupa um vazio deixado pela saída de cena do Zé Dirceu. Então, o grau de possibilidade que ela tem de ser sensível a demandas tem se apresentado muito menor do que o próprio Lula. Se há divergências no governo Lula, elas não se expressaram dentro da Casa Civil, que sempre foi um instrumento da política conservadora.
Num confronto direto entra uma suposta candidatura do Serra e a Dilma, a discussão do movimento socialista no Brasil será até que ponto as diferenças entre eles representariam a necessidade de um apoio, até porque em nenhum momento esse setor demonstrou a necessidade de ampliar suas alianças para um leque mais popular. Se for esse cenário, muito provavelmente a disputa eleitoral restrita ao campo conservador fará com que a gente se mantenha independente. O que nós precisamos fazer é superar a armadilha que nos tem levado a esse dilema. A grande questão é tornar mais nítido o campo político no Brasil. O fato de restar duas candidaturas não significa que a gente tenha que se basear na lógica do menos ruim. Na verdade, para a gente, as eleições de 2010 são parte de um longo processo que começou com a eleição do Fernando Henrique e que aponta para uma longa hegemonia conservadora. Se isso é verdade, uma posição agora momentânea de apoio não ajuda no acúmulo de forças das nossas tarefas mais adiante.

Você falou em presidencialismo de coalizão, isso seria uma opção do governo Lula ou a única forma possível de se chegar à presidência?
Uma vez optando por chegar ao poder eleitoralmente, o governo tinha legitimidade suficiente para poder criar rupturas...
Mas ele ia romper com quem financiou sua campanha?
Se você pegar a lógica eleitoral, ele chega com tal legitimidade ao governo que tinha como fazer, por exemplo, uma reforma política, um processo constituinte novo. Eu posso chegar ao governo com amarras e criar fatos políticos que me dêem melhores condições na disputa. Se a gente pegar os governos de frente popular na América Latina, sem entrar na caracterização deles, todos eles produzem reformas políticas de fundo e alterações constitucionais. Não é por acaso que o Brasil não faz isso. Então, a opção não é apenas a maneira de chegar ao poder, mas a maneira de manter-se no poder: optou-se pela eficiente máquina fisiológica de funcionamento do Estado. É eficiente esse método, só que é uma eficiência que mantém os limites da ação dentro da ordem.

Você falou que se perdeu um tempo precioso discutindo nomes ao invés de programa, mas, de forma mais geral, a esquerda não perde muito tempo com as eleições?
Perde. Na verdade, se a gente fizer uma análise dos últimos anos, a esquerda conseguiu avanços interessantes na luta social. Estivemos juntos em todas as lutas de resistência, no enfrentamento da crise, das demissões, na previdência, os trabalhadores pontualmente entraram em greve na defesa de seus direitos... Nessas lutas concretas a esquerda esteve junta, o que nos levou de um patamar de defensiva para um patamar de resistência, o que já é melhor. Agora, a eleição é um buraco negro, ela atrai tudo para a sua lógica. Faltou para certas organizações da esquerda uma maior maturidade para utilizar esse espaço não no sentido de acomodação.
Pensando na esquerda de forma mais ampla, nessas eleições você tem duas posições: de um lado o movimento social vai manter-se nas suas ações e vai ignorar o primeiro turno, e de um outro tem gente tão preocupada com as eleições que acaba fragmentando sua estratégia e a conexão com a tática imediata. Eu acho que são dois erros. A esquerda teria que ter maturidade para se manter firme em sua linha de resistência e acúmulo na construção de um pólo hegemônico e participar das eleições, transformando esse espaço numa possibilidade de apresentação dessas demandas, contrapondo o bloco conservador.

27/01/2010

Nove militantes do MST são presos em Iaras-SP

MST-SP
26/01/2010
Na manhã desta terça-feira (26/01) recebemos, com extrema preocupação, a informação de que desde o final da tarde de ontem a polícia está fazendo cercos aos assentamentos e acampamentos da reforma agrária na região de Iaras-SP, portando mandados de “busca, apreensão e prisão”, com o intuito de intimidar, reprimir e prender militantes do MST. Neste momento já estão confirmadas a detenção de 9 militantes assentados e acampados do MST, os quais se encontram na Delegacia de Bauru-SP. No entanto, há a possibilidade de mais prisões e outros tipos de repressão.
Os relatos vindos da região, bastante nervosos e apreensivos, apontam que os policiais além de cercarem casas e barracos, prenderem pessoas e promoverem o terror em algumas comunidades, também têm apreendido pertences pessoais de muitos militantes – exigindo notas fiscais e outros documentos para forjar acusações de roubos e crimes afins. A situação é gravíssima, o cerco às casas continua neste momento (já durando quase um dia inteiro), e as informações que nos chegam é que ele se manterá por mais dias.
Nossos advogados estão tentando, com muita dificuldade, acompanhar a situação e obter informações sobre os processos – pois a polícia não tem assegurado plenamente o direito constitucional às partes da informação sobre os autos e, principalmente, sobre as prisões . No entanto, é urgente que outros apoiadores Políticos, Organizações de Direitos Humanos e Jornalistas comprometidos com a luta pela reforma agrária e com a luta do povo brasileiro divulguem amplamente e acompanhem mais de perto toda a urgente situação. A começar pelas pessoas que vivem na região de Iaras-SP, Bauru-SP e Promissão-SP.
Situações como esta apenas reforçam a urgência da criação de novos mecanismos de mediação prévia antes da concessão de liminares de reintegração de posse, e de mandados de prisão no meio rural brasileiro – conforme previsto no Programa Nacional de Direitos Humanos 3 (PNDH-3) -, com o intuito de diminuir a violência contra trabalhadores rurais.
No caso específico e emergencial de Iaras-SP, tal repressão é o aprofundamento de todo um processo de criminalização e repressão que foi acelerado a partir da repercussão exagerada e dos desdobramentos políticos ocorridos na regional de Iaras-SP por ocasião da ocupação da Fazenda-Indústria Cutrale, em outubro de 2009. O MST reivindica há anos para a reforma agrária aquelas áreas do Complexo Monções, comprovadamente griladas da União por esta poderosa transnacional do agronegócio. Ao invés de se acelerar o processo de reforma agrária e a democratização do uso da terra, sabendo-se que naquela região do estado de São Paulo há milhares de famílias de trabalhadores rurais que precisam de um pedaço de chão para sobreviver e produzir alimentos, o que obtemos como “resposta” é ainda mais arbitrariedade, repressão e violência .
O MST-SP reforça o pedido de solidariedade a todos os lutadores e lutadoras do povo brasileiro comprometidos com a transformação do país numa sociedade mais justa e democrática, e de todos os cidadãos e cidadãs indignadas com a crescente criminalização da população pobre e de nossos movimentos sociais pelo país. Não podemos nos intimidar nem nos calar diante de tamanho absurdo!

26/01/2010

Haiti e a militarização nossa de cada dia

*Sandra Quintela
Colômbia com mais sete bases militares. Honduras sob um golpe militar legitimado por uma eleição sem legalidade. A Quarta Frota reativada em 1° de julho de 2008 -depois de mais de 50 anos desativada- e cuja função é patrulhar o Atlântico Sul. E agora o processo crescente de militarização da ajuda humanitária no Haiti.

No último dia 13 de janeiro, o mundo acordou com uma calamidade de dimensões assustadoras: um terço da população de um país, três milhões de pessoas desabrigadas, mais de 100 mil mortos, cerca de 40 mil mulheres grávidas sem a menor perspectiva de um teto para abrigar seus filhos e filhas. A comunidade internacional se movimenta a passos lentos no sentido de responder o quanto antes a essa tragédia: o terremoto do dia 12 de janeiro no Haiti.
Como explicar que a longínqua China envie alimentos que chegam mais rápido que os dos EUA, que está a menos de uma hora de vôo de Porto Príncipe? Como explicar que os mais de dois mil fuzileiros navais sejam os primeiros “bens” dos EUA a aportarem nesta ilha caribenha?

Cuba, Venezuela e a própria Comunidade do Caribe (Caricom) imediatamente enviaram seus médicos, pessoal qualificado para desastres dessa dimensão. O avião da Caricom não pôde aterrissar no aeroporto Toussaint Louverture, assim como o avião da Força Aérea Brasileira. Tiveram que aportar em Santo Domingo, na República Dominicana, uma vez que os fuzileiros navais dos EUA tomaram o controle do aeroporto e dos portos haitianos.

Cabe a pergunta: como se fecha portos e aeroportos logo após uma tragédia dessa dimensão em que a comunidade internacional está se mobilizando para o envio de medicamentos, comida e roupas? Fechar portos e aeroportos não compõe uma estratégia de guerra? Assim sempre soubemos.

Desde 2004, o Haiti está ocupado pelas tropas militares da ONU através da Missão de Estabilização do Haiti – Minustah. Desde então, várias organizações nacionais e internacionais têm se posicionado pela retirada das tropas. Após seis anos de permanência no país, pouquíssimo fizeram para a reconstrução do Haiti.

Sabemos que o comando militar dessa missão está sob responsabilidade do Brasil. Por depoimentos já veiculados na mídia, soubemos que as tropas brasileiras estão fazendo do Haiti um campo de treinamento.
Como já escrevemos em outros artigos, esses treinamentos servem ao processo de militarização de diversas periferias urbanas. Não é a toa que há treinamentos dessas tropas em favelas do Rio de Janeiro. Elas vão ao Haiti e depois retornam à cidade carioca, como foi o caso da ocupação do Morro da Providência pela Guarda Nacional, em 2008.

Nesse momento de catástrofe, nos perguntamos: que papel está tendo a Minustah? Onde estavam seus soldados nos primeiros dias da tragédia? Os relatos que nos chegam do Haiti são de que a população pobre ficou absolutamente abandonada.

Com o crescente papel dos EUA no processo de militarização da ajuda humanitária no Haiti, nos perguntamos o que faz o Presidente Obama, achando pouco enviar soldados que podem chegar ao número de 14 mil, mobilizar Bill Clinton e George W. Bush para serem os coordenadores do esforço de reconstrução do Haiti.

Como explicar que em um país tão pequeno e tão pobre do Caribe, dois ex-presidentes da maior potência de guerra do mundo – os EUA – sejam designados a cuidar de sua reconstrução? O que está por trás de tudo isso? Em nossa opinião, são estratégias de vários tipos de militarização de nossos países da América. Estamos vendo, ao vivo e em cores, em nome da ajuda humanitária, um país ser ocupado militarmente após uma catástrofe monumental.

Assim, temos que fortalecer o grito de retirada das tropas militares do Haiti. Não se faz ajuda humanitária com tropas militares. O povo haitiano, através de suas organizações e movimentos sociais, precisa ser apoiado para que sua voz fale mais alto no processo de reconstrução do país.

Desde última segunda- feira, (18/01) foi constituída no Brasil a Frente Nacional de Solidariedade ao povo haitiano formada por movimentos sociais do campo e da cidade, por centrais sindicais, pastorais sociais, movimento negro, de mulheres, enfim, um espectro amplo de organizações da esquerda brasileira. A tarefa central é trabalhar a ajuda direta junto a organizações sociais haitianas e pela retirada das tropas militares. Muito trabalho existe pela frente. A reconstrução do Haiti vai ser lenta. Mas, não esqueçamos a dívida histórica que todos temos com este país. O Haiti foi a primeira nação do mundo a abolir a escravidão. Será que é esse o seu pecado?

Sandra Quintela, economista, é integrante do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS)/ Rede Jubileu Sul.

25/01/2010

Haiti: estratégia do caos para uma invasão

José Luis Vivas
ALAI AMLATINA, 18/01/2010 – O terremoto que arrasou Porto Príncipe, em 12 de janeiro passado, oferece um pretexto inexorável para justificar a enésima invasão e ocupação militar do Haiti, já ocupado desde 2004, porém agora diretamente pelos principais promotores dessa ocupação, sem intermediários. Motivos, políticos e estratégicos, não faltam. Assim, serviria para repreender o principal intermediário da atual ocupação, Brasil, que apesar dos bons serviços prestados no Haiti não tem se portado da mesma maneira em relação ao recente golpe de Estado em Honduras.
O que temos observado até o momento parece corroborar a tese de que se está preparando uma nova ocupação militar, não humanitária. Vários elementos indicam, como: desavenças com os atuais ocupantes, com a Missão de Paz (MINUSTAH) da ONU, especialmente com o Brasil, que possui o comando militar; entorpecimento da ajuda humanitária e o fomento de uma situação de caos; e uma campanha midiática que consiste na criação de uma imagem de caos e violência, que justificaria uma ocupação ante a opinião pública. Como veremos abaixo, todos esses componentes parecem estar presentes.
Existem motivos para suspeitar de que se está permitindo deliberadamente a deterioração da situação humanitária no Haiti. Por exemplo, a reconhecida falta de coordenação nas tarefas de resgate, o que é amplamente difundido pelos meios de comunicação. Em teoria, corresponderia à ONU dirigir tais tarefas, porém, ao que parece, está foi desautorizada pelos Estados Unidos, que ocuparam rapidamente um dos locais-chaves para a coordenação das tarefas de resgate, o aeroporto. Sem a liderança da ONU e com um Estado haitiano “falido”, ou em outras palavras menos Orwelliano, quebrado de forma premeditada, não resta ninguém que possa dirigir as tarefas de resgate eficientemente. Nem tampouco as ONGs que vem recebendo fundos internacionais para exercer muitas das funções que são obrigações do governo haitiano. Não se pode exigir das ONGs as mesmas responsabilidades de um governo, um feito talvez muito conveniente nesses momentos.
Outro elemento é a morosidade no envio de ajuda por parte dos EUA, em contraste com a rapidez demonstrada em sua mobilização militar. Inclusive a distante China parece estar mais adiantada que os Estados Unidos no envio de auxílio. Assim, o ex-tenente geral do exército norte-americano, Russel Honoré, que participou das tarefas de resgate após o furacão Katrina, em 2005, declarou sobre a situação do Haiti pós-terremoto: “penso que isso já foi aprendido durante o Katrina, precisamos levar água e alimentos e começar a evacuar as pessoas... Penso que deveríamos ter começado isso o quanto antes”. Por exemplo, enquanto as forças armadas dos EUA parecem ter sido mobilizadas com bastante rapidez, um navio-hospital da marinha está se preparando com mais parcimônia: “é um navio lento, um pouco velho, que tardará uma semana para chegar”, declara um porta-voz do Pentágono. Talvez não possam fazer nada melhor com o velho navio, porém deveriam existir outros meios de acelerar as ajudas. Por exemplo, se podia seguir a sugestão pouco herética de Lawrence Korb, ex-secretário assistente de Defesa dos Estados Unidos, de aproveitar os conhecimentos dos cubanos em tarefas de resgate: “devemos parar e pensar que nossa vizinha Cuba conta com alguns dos melhores médicos do mundo... Deveríamos tentar transferi-los em nossos vôos”.
Tudo isso nos deixa a impressão de que, no melhor dos casos, as tarefas de resgate não são uma prioridade para o governo norte-americano, ao contrário daquelas puramente militares, como o envio de “3500 soldados da 82ª Divisão Aerotransportadora de Fort Bragg”, cuja missão “não está clara”, segundo o Christian Science Monitor. Mas, talvez fique mais clara com a explicação do porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Philip Crowley: “Nós não estamos nos apropriando do Haiti. Estamos ajudando a estabilizar o país. Estamos ajudando no fornecimento de material e socorro para salvar vidas, e vamos permanecer aqui a longo prazo para ajudar a reconstruir o Haiti”. E também as palavras posteriores da secretária de Estado, Hillary Clinton, assegurando que as forças norte-americanas ficarão no Haiti “hoje, amanhã e provavelmente no futuro”.
As divergências diplomáticas com outros países, especialmente com o Brasil, que está no comando das tropas da ONU no Haiti, não tardaram em manifestar-se, o que parece indicar também que a “missão” norte-americana no Haiti vai muito além do puramente humanitário. Até hoje o Brasil havia cumprido diligentemente com o papel que foi designado no Haiti. Suas tropas se dedicavam a controlar e, em certas ocasiões, aterrorizar a população haitiana, especialmente aos mais pobres, da mesma forma que atuam nas favelas do Brasil. Como informa em uma entrevista o jornalista Kim Ives, do Haiti Liberté, a pretensa missão de paz da ONU no Haiti, liderada pelos brasileiros, “é extremamente mal vista [pela população haitiana]. Essa gente está farta e cansada de que estejam gastando milhões, de observar como os jovens militares passam, dando volta por todas as partes com os tanques gigantescos, apontando os fuzis. E, como se sabe, esta é uma força cuja missão é a de submeter ao país”.
Era só esperar que os EUA entrassem em conflito com o Brasil caso a intenção do primeiro fosse a de assumir um papel militar no Haiti. O conflito não tardou em iniciar. Nas palavras do secretario geral da ONU, Ban Ki-moon, em 14 de janeiro, “seria absolutamente desejável que todas essas forças estivessem coordenadas pelo comandante da MINUSTAH”. Porém os EUA não aceitaram esta proposta. Funcionários do governo dos Estados Unidos indicaram que suas forças “coordenem” suas ações com a direção da MINUSTAH e nada mais: “Vamos atuar sob o comando dos EUA em apoio a uma missão da ONU em nome do governo e do povo haitiano”, declara Crowley.
É possível deduzir como essa “coordenação” está funcionando a partir da reação até do ministro de defesa do Brasil, Nelson Jobim, criticando o controle “unilateral” dos Estados Unidos sobre o aeroporto de Porto Príncipe, que segundo ele, foi tomado sem que outros países fossem consultados, e que estaria dificultando a aterrissagem dos aviões da FAB (Força Aérea Brasileira) carregados de pessoal e mantimentos. Como indica o periódico brasileiro Folha de São Paulo, essa situação “vem causando um pequeno problema diplomático entre Brasil e EUA. Além de retardar a aterrissagem dos aviões da FAB, os brasileiros se queixam de que o controle norte-americano esteja impedindo o acesso da MINUSTAH (Missão de paz da ONU no Haiti, liderada pelos brasileiros) ao local [o aeroporto]”.
Apesar das posteriores declarações de Hillary Clinton a Jobim, assegurando que “as forças norte-americanas vão cumprir funções essencialmente humanitárias, sem interferir na segurança pública do país”, o fato é que tais funções “humanitárias” estão sendo comandadas “não por agências civis do governo... e sim pelo Pentágono”, através do SOUTHCOM (Comando Sul dos Estados Unidos), cuja missão é a de “conduzir operações militares e proporcionar a cooperação na segurança para alcançar objetivos estratégicos dos Estados Unidos”, como assinala Michel Chossudovsky, do Global Research.
Outro elemento importante é a aparente instrumentalização de um suposto estado de caos no Haiti, o que também poderia ter sido contribuído pela talvez premeditada falta de coordenação na distribuição da ajuda humanitária. O objetivo aqui seria o de criar uma imagem de caos e violência que justifique a invasão ante a opinião pública e, para isso, é necessário contar com a estreita colaboração dos grandes meios de informação. Ao menos os meios mais afinados com o governo norte-americano parecem não ter perdido tempo neste sentido. Desde um primeiro momento vem tratando de dramatizar a situação, por exemplo, através da difusão de rumores de rajadas de supostos tiroteios, que ninguém mais parece ter ouvido em Porto Príncipe, ou da formação de novos bandos criminosos. Assim, dois dias depois do terremoto, já podíamos ler em um artigo intitulado “Tomarão os bandos criminosos o controle do caos haitiano?”, as seguintes pesarosas palavras: “quando a escuridão cobriu a cidade de Porto Príncipe, assolada pelo terremoto, moradores informaram que escutaram tiros. Isso dificilmente é uma surpresa: no Haiti, durante as emergências – naturais ou políticas – tiros podem ser tão onipresentes na noite como o latido dos cachorros, como grupos armados apossando-se das ruas”. O fato de que ninguém parece ter ouvido esses tiros nem visto tais gangues tomando as ruas, pode indicar que a intenção aqui é a de criar uma falsa imagem de caos, o que torna mais aceitável para a opinião pública uma eventual invasão e ocupação do país.
Agora, a maior parte dos meios insiste nessas imagens de caos e violência. Porém, há exceções. Assim, como explica o coordenador do Canadian Haiti Action Network, Roger Annis, referindo-se a uma reportagem da BBC que não mostra nada dessa suposta violência, o que “contrasta fortemente com as advertências de saques e violência que chegam em ondas pelos canais de notícias, tais como a CNN”, e que “estão sendo reproduzidas pelo secretário de Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates”.
O mais macabro de tudo isso é que as ajudas poderiam não estar chegando aos necessitados devido a uma intenção deliberada de provocar esse mesmo estado de caos e violência que parece não existir até o momento. Segundo Roger Annis “está crescendo a evidência acerca de uma negligência monstruosa induzida ao povo haitiano após três dias do terremoto. À medida que as provisões médicas vitais, alimentos, substâncias químicas para a purificação da água e veículos se estão amontoando no aeroporto de Porto Príncipe, e que os meios estão informando sobre um esforço internacional massivo para fornecer ajuda de emergência, os moradores da cidade destroçada se perguntam quando poderão ver algum tipo de ajuda”.
O repórter da BBC, Andy Gallaguer, declara também que andou por todas as partes da capital durante sexta-feira, 15 de janeiro, e que “não observou nada mais que cortesia da parte dos haitianos que encontrou. Em toda parte foi levado pelos moradores para ver o que havia acontecido em suas vizinhanças, suas casas e suas vidas. E então perguntavam: onde estão as ajudas?”. Sobre a declaração do secretário de defesa norte-americano que motivos de “segurança” estariam impedindo a distribuição de ajuda, Gallaguer contesta que “eu não estou vendo nada disso”. Quanto a situação no aeroporto, informa que “há uma grande quantidade de material em solo e muita gente ali. Eu não sei que problemas há com a entrega”. Igualmente, segundo palavras de um observador local, “os agentes dos meios de comunicação estão buscando histórias de haitianos desesperados, que estão atuando de forma histérica, quando, na realidade o mais comum é vê-los agindo de forma sossegada. Enquanto isso, a comunidade internacional, a elite e os políticos estão irritados com esse assunto e nenhum dos haitianos parece ter a mínima idéia do que está passando”.
Não somente não há planos de transportar médicos cubanos à ilha, como a ocupação do aeroporto se deu imediatamente depois da chegada de 30 médicos cubanos para reunir-se com os cerca de 300 que já estavam na ilha a mais de um ano. E muitos suspeitam que isso pode ter algo relacionado com a ocupação do aeroporto. Trinidad & Tobago Express, por exemplo, informa que “uma missão de ajuda emergencial da Comunidade Caribenha (Caricom) ao Haiti, incluindo os chefes de governos e funcionários técnicos de destaque, não puderam obter permissão esta sexta-feira para aterrissar no aeroporto do país devastado, agora sob o controle dos EUA”. Além disso, “indagado acerca de se as dificuldades encontradas pela missão de Caricom poderiam estar relacionadas com informes de que as autoridades norte-americanas não estariam ansiosas em facilitar a aterrissagem das naves procedentes de Cuba e Venezuela, o primeiro ministro Golding [da Jamaica] respondeu que ‘somente espera que não haja nenhuma verdade nesse tipo de pensamento imaturo, a luz da espantosa extensão da tragédia do Haiti’...”.
O seguinte testemunho é do diretor do Ciné Institute de Jacmel, David Belle, também contradiz radicalmente a imagem de caos e violência difundida pelos meios de comunicação. “Várias pessoas comentaram comigo que muitos meios informativos norte-americanos pintam o Haiti como um barril de pólvora pronto para explodir. Disseram-me que as principais reportagens dos grandes meios só falam de violência e caos. Nada está mais distante da realidade... Nenhuma única vez fui testemunha de um só ato de agressão ou violência. Ao contrário, temos visto vizinhos ajudando vizinhos e amigos ajudando amigos e estranhos. Temos visto vizinhos escavando escombros com as mãos nuas para encontrar sobreviventes. Temos visto curandeiros tradicionais tratando dos feridos; temos visto cerimônias solenes anteriores aos enterros coletivos e moradores esperando, pacientemente, sob um sol abrasador, com nada mais que uns poucos pertences que sobraram. Uma cidade mutilada de dois milhões de seres esperando ajuda, remédio, alimento e água. A maioria não recebeu nada. O Haiti pode orgulhar-se de seus sobreviventes. Sua dignidade e decência frente a esta tragédia são assombrosas”.
Todos esses elementos justificam a suspeita de que está em marcha uma macabra estratégia de caos para justificar uma invasão e ocupação que, pelo visto, nada terá de humanitária.
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Tradução: Maria Fernanda Magalhães Scelza