13/02/2009

Dia nacional de lutas

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Por Higor Oliveira
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A esquerda brasileira, encabeçada pelo PCB, MST, Intersical, Conlutas, Pastoral, PSOL e PSTU chama à luta todos os trabalhadores e trabalhadoras brasileiras. O dia 10 de abril será lembrado como dia nacional de luta contra o capitalismo e suas mazelas.
A crise do capitalismo já tem reflexos para a classe trabalhadora: demissões em massa, precarização das relações de trabalho e retirada de direitos são só alguns exemplos da solução encontrada pelos patrões, maestros de crises sucessivas e fomentadores da miséria.
A conta da crise já está nas mãos dos trabalhadores do mundo todo, enquanto isso os governos transferem deliberadamente volumosas quantias de dinheiro às mãos sujas de burgueses inescrupulosos que são os verdadeiros responsáveis por tal estado de coisas.
Nos últimos anos as empresas dos mais variados seguimentos econômicos exploraram trabalhadores e obtiveram lucros recordes. Para onde foi tanto dinheiro? Para a especulação e ganância de uns poucos que agora batem às portas dos governos para, com o argumento da crise e sob resguardo de uma imprensa igualmente inescrupulosa, pedir dinheiro público para salvas seu jogo de cassino que leva à morte milhares de pessoas todos os dias.
A imprensa por sua vez leva adiante sua bandeira de criminalizar a pobreza e colocar o pobre como o único culpado pelos problemas do sistema. É um jogo sinistro de empurra-empurra no qual cada um quer garantir o seu e despejar as conseqüências sobre à classe trabalhadora.
É por tudo isso que chamamos os trabalhadores para a luta no próximo dia 10 de abril, quando vamos, numa voz conjunta com a da classe trabalhadora internacional gritar contra o capitalismo, suas crises e conseqüências, contra a política de transferência de renda aos mais ricos empreendida pelo governo Lula e contra o imperialismo estadunidense que já se reveste de uma nova fantasia sob Obama.
Assim como já fizeram os Gregos, os Franceses e tantos outros povos, faremos nós, ocuparemos as ruas e gritaremos NÃO à crise e ao sistema que a gerou.

12/02/2009

Eleições em Israel

Por Duarte Pereira

As eleições legislativas israelenses tiveram os resultados que eram previstos: fortaleceram os partidos de direita (o Kadima, fundado pelo ex-premiê Ariel Sharon e hoje liderado pela ministra de Relações Exteriores Tzipi Livni, filha de um militante terrorista do Irgun e ex-agente do serviço secreto israelense Mossad, e o Likud, liderado pelo ex-premiê e notório conservador Binyamin Netanyahu) e de extrema-direita (como o Israel Beiteinu, liderado pelo nacional-fascista Avigdor Lieberman, político em ascensão, oriundo da Moldávia, na antiga União Soviética).
O Partido Trabalhista, de centro-direita, que liderou a criação do Estado de Israel e dominou a política israelense durante várias décadas, caiu para o quarto lugar. E o Partido Comunista Hadash, de esquerda, composto por judeus e árabes, conquistou apenas quatro lugares no Parlamento de 55 cadeiras. O principal negociador palestino Saeb Erekat, de tendência moderada, extraiu a única conclusão que os programas dos partidos israelenses vitoriosos permitem: liderado pelo Kadima ou pelo Likud e apoiado por partidos de direita e religiosos, “o futuro governo de Israel não aceitará a solução de dois Estados e continuará com a construção de assentamentos, incursões e ataques”.
A resistência palestina e seus amigos em Israel, nos países árabes e islâmicos e nos demais países do mundo precisam, portanto, preparar-se para o pior, intensificando uma campanha de esclarecimento, em vários níveis e por diversos meios, sobre a história do movimento sionista e da reconquista armada gradativa da Palestina; sobre a dramática situação dos palestinos em Israel, na Cisjordânia, na Faixa de Gaza e nos campos de refugiados; e sobre a falsa aceitação por Israel da solução dos dois Estados.
O que Israel pretende é, na realidade, um Estado e meio, ou seja, um Estado de Israel cada vez mais expandido e forte, ao lado de uma Faixa de Gaza transformada num grande e sitiado gueto palestino, de uma rede de bantustões palestinos na Cisjordânia cercados por tropas e assentamentos judaicos, e de milhares e milhares de famílias palestinas condenadas a uma vida precária e sem perspectiva nos campos de refugiados dos países vizinhos.
Acreditar que a pressão do governo estadunidense de Barack Obama possa, por iniciativa própria, alterar esse quadro, é esquecer o papel que a Grã-Bretanha, a França e os Estados Unidos, como potências imperialistas, desempenharam e continuam desempenhando na criação e manutenção dessa tragédia, inclusive pela importância estratégica das jazidas árabes e iranianas de petróleo e gás para a voragem consumista dos países capitalistas ocidentais. O internacionalismo dos partidos de esquerda, dos movimentos populares e das entidades e personalidades democráticas do Brasil será posto à prova nos próximos meses.

11/02/2009

Conservadores e direita radical avançam na eleição em Israel

Os conservadores e a direita radical nunca foram tão fortes desde que Menahem Begin conseguiu em 1977 a primeira vitória do Likud. Os deputados conquistados pelos partidos da direita e a ultra-direita, os que representam o voto dos colonos, e dos ultra-ortodoxos chegaram ao seu nível mais alto, beirando os 65. Antes eram 53. O Kadima de Tsipi Livni venceu as eleições, mas apenas pela margem mínima de um deputado. Resultado: tanto ela quanto Benjamin Netanyahu, do Likud, que ficou em segundo lugar, cantaram vitória.
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Esquerda.Net
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O Kadima de Tsipi Livni venceu as eleições israelenses, mas apenas pela margem mínima de um deputado. Resultado: tanto ela quanto Benjamin Netanyahu, do Likud, que ficou em segundo lugar, cantaram vitória. Ambos já se lançaram na corrida para tentar garantir uma coligação maioritária. O fiel da balança é o partido ultra-direitista Israel Beiteinou, de Avigdor Lieberman. Faltando apenas contar os votos dos israelenses no exterior, o Kadima obteve 28 lugares no Parlamento de Israel, perdendo um deputado.
O Likud, de Benjamin Netanyahu foi o partido que mais avançou, passando de 19 para os 27 lugares. No terceiro posto ficou o Israel Beiteinou, que subiu de 11 para 15 deputados, relegando para o quarto posto o Partido Trabalhista do ministro da Defesa, Ehud Barak, que elegeu 13 deputados, perdendo seis. O ultra-ortodoxo Shas perdeu um deputado, elegendo 11. Tzipi Livni declarou-se vitoriosa e exigiu o respeito pela vontade popular. "O povo escolheu o Kadima", proclamou Livni, defendendo que "agora é necessário respeitar a escolha dos eleitores, respeitar a decisão das urnas, e formar um governo de União Nacional sobre a nossa direcção".
Mas, a menos que consiga chegar a um acordo com o Likud ou com Lieberman, as hipóteses de Livni conseguir o apoio de 61 deputados parecem inexistentes. Consciente de que está melhor colocado na corrida para formar governo, Benjamin Netanyahu fez igualmente um discurso de vitória, apesar de ter ficado em 2º lugar. "O povo exprimiu-se claramente, o campo nacional, dirigido pelo Likud, regista um claro avanço", afirmou. Já Avigdor Lieberman deixou em aberto as suas opções, mostrando-se disposto a negociar com Livni e com Netanyahu, apesar de reconhecer que pende para o lado do Likud: "Nós sempre quisemos um governo nacional, um governo de direita e espero que o consigamos", disse. Lieberman defende que o próximo governo israelense tem de "derrotar o Hamas" e rejeitar qualquer negociação de tréguas. Os conservadores e a direita radical nunca foram tão fortes desde que Menahem Begin conseguiu em 1977 a primeira vitória do Likud.
Os deputados conquistados pelos partidos da direita e a ultra-direita, os que representam o voto dos colonos, e dos ultra-ortodoxos chegaram ao seu nível mais alto, beirando os 65. Antes eram 53. O afundamento do Partido Trabalhista, o fundador do Estado de Israel, com apenas 13 deputados, adquire dimensão histórica, comenta o diário espanhol El País. Logo depois da publicação dos resultados oficiais, dentro de uma semana, o presidente Shimon Peres deverá ouvir todos os partidos e decidir se nomeará a líder do maior partido, Tzipi Livni, ou o líder do maior bloco, Benjamin Netanyahu, para formar o novo governo. Quem quer que seja nomeado disporá de seis semanas para concluir a tarefa.
Fonte: Correio da Cidadania

"Solução neokeynesiana e novo Bretton Woods são fantasias"

(entrevista com István Mészàros)
Em entrevista à revista inglesa Socialist Review, István Mészàros, um dos principais pensadores marxistas da atualidade, analisa a crise econômica mundial e critica aqueles que apostam que ela será resolvida trazendo de volta as idéias keynesianas e a regulação. "É uma fantasia que uma solução neo-keynesiana e um novo Bretton Woods resolveriam qualquer dos problemas dos dias atuais", defende Mészàros. Para ele, estamos vivendo a maior crise na história humana, em todos os sentidos.
Judith Orr e Patrick Ward - Socialist Review
Data: 07/02/2009
Em 1971 István Mészàros ganhou o Prêmio Deutscher pelo seu livro A Teoria da Alienação em Marx e desde então tem escrito sobre o marxismo. Em janeiro deste ano, ele conversou com Judith Orr e Patrick Ward, da Socialist Review, sobre a atual crise econômica.
Socialist Review: A classe dominante sempre é surpreendida por crises econômicas e fala delas como fossem aberrações. Por que você acha que as crises são inerentes ao capitalismo?
István Mészàros – Eu li recentemente Edmund Phelps, que ganhou o Prêmio Nobel de Economia, em 2006. Phelps é um tipo de neokeynesiano. Ele estava, é claro, glorificando o capitalismo e apresentando os problemas atuais como apenas um contratempo, dizendo que "tudo o que devemos fazer é trazer de volta as idéias keynesianas e a regulação."John Maynard Keynes acreditava que o capitalismo era ideal, mas queria regulação. Phelps estava reproduzindo a idéia grotesca de que o sistema é como um compositor musical. Ele pode ter alguns dias de folga nos quais não pode produzir tão bem, mas se você olhar no todo verá que ele é maravilhoso! Pense apenas em Mozart – ele deve ter tido o velho e esquisito dia ruim. Assim é o capitalismo em crise, como dias ruins de Mozart. Quem acredita nisso deveria ter sua cabeça examinada. Mas, no lugar de ter sua cabeça examinada, ele ganhou um prêmio. Se nossos adversários têm esse nível de pensamento – o qual tem sido demonstrado, agora, ao longo de um período de 50 anos, não é apenas um escorregão acidental de economista vencedor de prêmio – poderíamos dizer, "alegre-se, esse é o nível baixo do nosso adversário". Mas com esse tipo de concepção você termina no desastre de que temos experiência todos os dias. Nós afundamos numa dívida astronômica. As dívidas reais neste país (Inglaterra) devem ser contadas em trilhões. Mas o ponto importante é que eles vêm praticando orgias financeiras como resultado de uma crise estrutural do sistema produtivo. Não é um acidente que a moeda tenha inundado de modo tão adventista o setor financeiro. A acumulação de capital não poderia funcionar adequadamente no âmbito da economia produtiva. Agora estamos falando da crise estrutural do sistema. Ela se extende por toda parte e viola nossa relação com a natureza, minando as condições fundamentais da sobrevivência humana. Por exemplo, de tempos em tempos anunciam algumas metas para diminuir a poluição. Temos até um ministro da energia e da mudança climática, que na verdade é um ministro do lero lero, porque nada faz além de anunciar uma meta. Só que essa meta nunca é sequer aproximada, quanto mais atingida. Isso é uma parte integral da crise estrutural do sistema e só soluções estruturais podem nos tirar desta situação terrível.
SR - Você descreveu os EUA como levando a cabo um imperialismo de cartão de crédito. O que você quer dizer com isso?
IM – Eu lembro do senador norte-americano George McGovern na guerra do Vietnã. Ele disse que os EUA tinham fugido da guerra do Vietnã num cartão de crédito. O recente endividamento dos EUA está azedando agora. Esse tipo de economia só avança enquanto o resto do mundo pode sustentar sua dívida. Os EUA estão numa posição única porque tem sido o país dominante desde o acordo de Bretton Woods. É uma fantasia que uma solução neokeynesiana e um novo Bretton Woods resolveriam qualquer dos problemas dos dias atuais. A dominação dos EUA que Bretton Woods formalizou imediatamente depois da Segunda Guerra era realista economicamente. A economia norte-americana estava numa posição muito mais poderosa do que qualquer outra economia do mundo. Ela estabeleceu todas as instituições econômicas internacionais vitais com base no privilégio dos EUA. O privilégio do dólar, o privilégio aproveitado pelo Fundo Monetário Internacional, pelas organizações comerciais, pelo Banco Mundial, todos completamente sob a dominação dos EUA, e ainda permanece assim hoje. Não se pode fazer de conta que isso não existe. Você não pode fantasiar reformas e regulações leves aqui e acolá. Imaginar que Barack Obama vai abandonar a posição dominante de que os EUA dispõe, nesse sentido – apoiada pela dominação militar – é um erro.
SR – Karl Marx chamou a classe dominante de "bando de irmãos guerreiros". Você acha que a classe dominante vai trabalhar junta, internacionalmente, para encontrar uma solução?
IM – No passado o imperialismo envolveu muitos atores dominantes que asseguraram seus interesses mesmo às custas de duas horrendas guerras mundiais no século XX. Guerras parciais, não importa o quão horrendas são, não podem ser comparadas ao realinhamento do poder e da economia que seria produzido por uma nova guerra mundial. Mas imaginar uma nova guerra mundial é impossível. É claro que ainda há alguns lunáticos no campo militar que não negariam essa possibilidade. Mas isso significaria a destruição total da humanidade. Temos de pensar as implicações disso para o sistema capitalista. Era uma lei fundamental do sistema que se uma força não pudesse ser assegurada pela dominação econômica você recorreria à guerra. O imperialismo global hegemônico tem sido conquistado e operado com bastante sucesso desde a Segunda Guerra Mundial. Mas esse tipo de sistema é permanente? É concebível que nele não surjam contradições, no futuro?Algumas pistas vêm sendo dadas pela China de que esse tipo de dominação econômica não pode avançar indefinidamente. A China não será capaz de seguir financiando isso. As implicações e consequencias para a China já são bastante significantes. Deng Xiaoping uma vez disse que a cor do gato – seja ele capitalista ou socialista – não importa, desde que ele pegue o rato. Mas e se, no lugar da caçada feliz do rato se termine numa horrenda infestação de ratos de desemprego massivo? Isso está acontecendo agora na China. Essas coisas são inerentes nas contradições e antagonismos do sistema capitalista. Portanto, temos de pensar em resolvê-los de uma maneira radicalmente diferente, e a única maneira é uma genuína transformação socialista do sistema.
SR - Não há em parte alguma do mundo econômico desacoplamento dessa situação?
IM- Impossível! A globalização é uma condição necessária do desenvolvimento humano. Desde que o sistema capitalista se tornou claramente visível Marx teorizou isso. Martin Wolf, do Financial Times tem reclamado de que há muitos pequenos, insignificantes estados que causam problemas. Ele argumenta que seria preciso uma "integração jurisdicional", em outras palavras, uma completa integração imperialista – um conceito fantasia. Trata-se de uma expressão das contradições e antagonismos insolúveis da globalização capitalista. A globalização é uma necessidade, mas a forma em que é exequível e sustentável é a de uma globalização socialista, com base nos princípios socialistas da igualdade substantiva. Ainda que não haja desacoplamento na história do mundo, é concebível que isso não signifique que em toda fase, em todas as partes do mundo, haja uniformidade. Muitas coisas diferentes estão se desenvolvendo na América Latina, em comparação com a Europa, para não mencionar o que eu já assinalei sobre a China, o Sudeste Asiático e o Japão, que está mergulhado em problemas mais profundos. Vamos pensar no que aconteceu há pouco tempo. Quantos milagres tivemos no período do pós-guerra? O Milagre Alemão, o Milagre Brasileiro, o Milagre Japonês, o Milagre dos cinco Tigres Asiáticos? Engraçado que todos esses milagres tenham se convertido na mais terrível realidade prosaica. O denominador comum de todas essas realidades é o endividamento desastroso e a fraude. Um dirigente de um fundo hedge foi supostamente envolvido numa farsa envolvendo 50 bilhões de dólares. A General Motors e outras estavam pedindo ao governo norte-americano somente 14 bilhões de dólares. Que modesto! Eles deveriam ter dado 100 bilhões. Se um fundo hedge capitalista pode organizar uma suposta fraude de 50 bilhões, eles devem chegar a todos os fundos possíveis. Um sistema que opera nesse modo moralmente podre não pode provavelmente sobreviver, porque é incontrolável. As pessoas chegam a admitir que não sabem como isso funciona. A solução não é desesperar-se, mas controlá-lo em nome da responsabilidade social e de uma radical transformação da sociedade.
SR – A tendência inerente do capitalismo é exigir dos trabalhadores o máximo possível, e isso é claramente o que os governos estão tentando fazer na Grã Bretanha e nos EUA.
IM – A única coisa que eles podem fazer é advogar pelos salários dos trabalhadores. A razão principal pela qual o Senado recusou a injetar 14 bilhões de dólares nas três maiores companhias de automóveis é que não puderam obter acordo sobre a drástica redução dos salários. Pense no efeito disso e nos tipos de obrigações que esses trabalhadores têm – por exemplo, repagando pesadas hipotecas. Pedir-lhes que simplesmente passem a receber metade de seus salários geraria outros tipos de problemas na economia – de novo, a contradição. Capital e contradições são inseparáveis. Temos de ir além das manifestações superficiais dessas contradições e de suas raízes. Você consegue manipulá-las aqui e ali, mas elas voltarão como uma vingança. Contradições não podem ser jogadas para debaixo do tapete indefinidamente, porque o carpete, agora, está se tornando uma montanha.
SR – Você estudou com Georg Lukács, um marxista que retomou o período da Revolução Russa e foi além.
IM – Eu trabalhei com Lukács sete anos, antes de deixar a Hungria em 1956 e nos tornamos amigos muito próximos até a sua morte, em 1971. Sempre nos olhamos nos olhos – é por isso que eu queria estudar com ele. Então aconteceu que quando eu cheguei para estudar com ele, ele estava sendo feroz e abertamente atacado, em público. Eu não aguentei aquilo e o defendi, o que levou a todos os tipos de complicações. Logo que deixei a Hungria, fui designado sucessor, na universidade, ensinando estética. A razão pela qual deixei o país foi precisamente porque estava convencido de que o que estava acontecendo era uma variedade de problemas muito fundamentais que o sistema não poderia resolver. Eu tentei formular e examinar esses problemas em meus livros, desde então. Em particular em "A Teoria da Alienação em Marx" e "Para Além do Capital" (*). Lukács costumava dizer, com bastante razão, que sem estratégia não se pode ter tática. Sem uma perspectiva estratégica desses problemas você não pode ter soluções do dia-a-dia. Então eu tentei analisar esses problemas consistentemente, porque eles não podem ser simplesmente tratados no nível de um artigo que apenas relata o que está acontecendo hoje, ainda que haja uma grande tentação de fazê-lo. No lugar disso, deve ser apresentada uma perspectiva histórica. Eu venho publicando desde que meu primeiro ensaio justamente substancial foi publicado, em 1950, num periódico literário na Hungria e eu tenho trabalhado tanto como posso, desde então. À medida de nossos modestos meios, damos nossa contribuição em direção da mudança. Isso é o que tenho tentado fazer ao longo de toda minha vida.
SR- O que você pensa das possibilidades de mudança neste momento?
IM – Os socialistas são os últimos a minimizar as dificuldades da solução. Os apologistas do capital, sejam eles neokeynesianos ou o que quer que sejam, podem produzir todos os tipos de soluções simplistas. Eu não penso que podemos considerar a crise atual simplesmente da maneira que o fizemos no passado. A crise atual é profunda. O diretor substituto do Banco da Inglaterra admitiu que esta é a maior crise econômica na história da humanidade. Eu apenas acrescentaria que esta não é apenas a maior crise na história humana, mas a maior crise em todos os sentidos. Crises econômicas não podem ser separadas do resto do sistema. A fraude e a dominação do capital e a exploração da classe trabalhadora não podem continuar para sempre. Os produtores não podem ser postos constantemente e para sempre sob controle. Marx argumenta que os capitalistas são simplesmente personificações do capital. Não são agentes livres; estão executando imperativos do sistema. Então, o problema da humanidade não é simplesmente vencer um bando de capitalistas. Pôr simplesmente um tipo de personificação do capital no lugar do outro levaria ao mesmo desastre e cedo ou tarde terminaríamos com a restauração do capitalismo. Os problemas que a sociedade está enfrentando não surgiram apenas nos últimos anos. Cedo ou tarde isso tem de ser resolvido e não, como o vencedor do Prêmio Nobel deve fantasiar, no interior da estrutura do sistema. A única solução possível é encontrar a reprodução social com base no controle dos produtores. Essa sempre foi a idéia do socialismo. Nós alcançamos os limites históricos da capacidade do capital controlar a sociedade. Eu não quero dizer apenas bancos e instituições financeiras, ainda que eles não possam controlá-las, mas o resto. Quando as coisas dão errado ninguém é responsável. De tempos em tempos os políticos dizem: "Eu aceito total responsabilidade", e o que acontece? Eles são glorificados. A única alternativa exequível é a classe trabalhadora, que é a produtora de tudo o que é necessário em nossa vida. Por que eles não deveriam controlar o que produzem? Eu sempre enfatizei em todos os livros que dizer não é relativamente fácil, mas temos de encontrar a dimensão positiva. István Mészàros é o autor do recentemente publicado "The challenge and burden of Historical Time", "Os Desafios e o Fardo do Tempo Histórico", publicado no Brasil pela Boitempo Editorial, 2007.(*) Ambos publicados no Brasil pela Boitempo Editorial.
Artigo originalmente publicado na Socialist Review
Tradução: Katarina Peixoto

09/02/2009

Sebastião Salgado busca imagens de um planeta perdido

Aos 65 anos, fotógrafo dedica-se ao Projeto Gênesis, no qual busca capturar imagens de recantos do planeta Terra intocados pela destruição. “De início, pensei em fotografar as fábricas que contaminam e os depósitos de lixo. Mas, depois, decidi que a única forma de darmos um estímulo, de trazer esperança, é exibir as imagens do planeta original, para que se veja a inocência e para que entendamos o que se deve preservar”, explica Sebastião Salgado.
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Clarissa Pont
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PORTO ALEGRE - Conheci Sebastião Salgado em 2000, quando o fotógrafo veio à Porto Alegre apresentar as fotografias da exposição Êxodos, com Lélia Wanick Salgado e um dos dois filhos. A série de 60 ampliações em preto-e-branco que já rodaram o mundo reuniam as vítimas da guerra no Afeganistão, os trabalhadores rurais sem-terra brasileiros e a população curda que vive no Norte do Iraque. Um mosaico do processo global que atinge “toda a família humana”, como dizia a apresentação da exposição na época. Durante seis anos, Sebastião Salgado percorreu mais de 45 países para registrar o processo de reorganização populacional pelo qual passava grande parte da humanidade no final do século passado. Ainda hoje, em todo o mundo são milhões de pessoas que migram movidas pelas mais diversas e dramáticas razões: “destruição do meio ambiente, repressão política, guerras, pobreza absolta ou pressão demográfica”, enumerava a abertura da exposição. “Em Moçambique, quando trabalhei em campos de refugiados em 1994, muitas vezes me vi cercado por crianças que me distraiam a atenção querendo aparecer nas imagens. Fiz um acordo com elas: eu as fotografaria e, em troca, elas me deixariam trabalhar em paz. Usei a mesma tática sempre que a situação se repetiu. Mais tarde, enquanto editava o trabalho, percebi que tinha um conjunto importante de fotografias de crianças mostrando dignidade em cada retrato, imagens de homens e mulheres com os quais a humanidade deve contar pra construir o novo século”, disse Salgado sobre as imagens que completaram a mostra em Porto Alegre: Retratos de crianças do Êxodos. Sobre ele, gente como Ivan Lessa já disse que “descobriu aquilo que todos nós desconfiamos mas não temos coragem de articular: pobre, dependendo da iluminação e do ângulo, dá um dinheirão”. E gente como Eduardo Galeano que as fotografias de Salgado permitem ao mundo ver “la gran odisea de nuestro tiempo, este viaje con más náufragos que navegantes”, conforme destacou matéria do jornal La Jornada sobre os 65 anos do fotógrafo. Para mim, ficou a impressão de um homem triste, o que só me fez respeitar mais cada uma das imagens. A sensação era de que Salgado realmente carregava nas costas o peso de cada uma das fotografias que apresentava ao público do Araújo Viana, onde ele esteve novamente em 2003, no Fórum Social Mundial e me pareceu inclusive mais leve, ao lado de Eduardo Galeano, Aleida Guevara, Hebe de Bonafini, Augusto Boal, Vito Giannotti, José Arbex e João Pedro Stédile para o lançamento do jornal Brasil de Fato. O único sorriso foi para um prato de ambrosia, sobremesa do almoço. Sebastião Salgado completou neste domingo (8) 65 anos fiel a este missão que o acompanha desde que abandonou a economia: capturar imagens que tenham o poder de fazer visíveis os excluídos. A preservação do planeta é um dos novos temas caros às lentes de Salgado, hoje dedicado ao projeto Gênesis, no qual busca capturar imagens de recantos do Planeta Terra intocados pela destruição. “De início, pensei em fotografar as fábricas que contaminam e os depósitos de lixo. Mas, depois, decidi que a única forma de darmos um estímulo, de trazer esperança, é exibir as imagens do planeta original, para que se veja a inocência e para que entendamos o que se deve preservar”, disse. Gênesis se estenderá até 2012, mas as primeiras imagens já foram utilizadas em exposições e podem ser conferidas na página eletrônica do britânico The Guardian, incluem fotos em branco e preto de baleias da Patagônia, da Ilha de Galápos e da Antártida. O enfoque otimista é um giro radical no trabalho de Salgado. Formado em economia pela Universidade de São Paulo, Salgado trocou os números pela fotografia após viajar para a África levando emprestada a câmera fotográfica da companheira, Lélia Wanick Salgado, responsável pela curadoria e editoria da maioria de seus trabalhos. Outras Américas, sobre os pobres na América Latina, foi publicado em 1986. Na seqüência, publicou Sahel: O Homem em Pânico (também publicado em 1986), resultado de uma longa colaboração de quinze meses com a ONG Médicos sem Fronteiras cobrindo a seca no Norte da África.Entre 1986 e 1992, Salgado se concentrou na documentação do trabalho manual em todo o mundo, publicada e exibida sob o nome Trabalhadores, um feito monumental que confirmou sua reputação como fotodocumentarista de primeira linha. De 1993 a 1999, foi o período em que produziu Êxodos e Retratos de Crianças do Êxodo, publicados em 2000.“Fotógrafos vão longe. É uma profissão em que você vive pra fora, tem válvula de escape o tempo todo. Estive no México há poucos anos, foi o aniversário de 100 anos do Álvarez Bravo. O Henri Cartier-Bresson morreu com 96 anos. Lembro quando trabalhava na agência Magnum, a Eve Arnold, que tinha mais de 85 anos na época, pegava a máquina, entrava no avião e ia para a Índia fotografar. Não me vejo a muito curto prazo terminar minha carreira. Fazer projetos de oito anos como o do Gênesis já é mais complicado, mesmo porque está difícil organizar projetos assim mais longos. Possivelmente este seja meu último longo projeto. A partir daí, vou viver como todo o mundo, o dia-a-dia”, resumiu Salgado em entrevista à Terra Magazine.