03/07/2009

BALANÇO DAS NEGOCIAÇÕES SALARIAIS DE 2008 E 2009: NÃO HÁ O QUE COMEMORAR

Renato Nucci Junior (Secretário Político do PCB-Campinas e membro da CPR-São Paulo)

O Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese), publicou recentemente dois estudos que analisam o resultado dos pisos salariais negociados nas campanhas salariais de 2008 e do primeiro semestre de 2009. Suas conclusões são importantes, pois refletem como os trabalhadores estão respondendo aos efeitos da crise econômica sobre o poder de compra dos salários.
A Nota Técnica nº 83, de junho de 2009, intitulada “A negociação de reajustes salariais em meio à crise internacional”, está baseada na análise de 100 negociações salariais ocorridas no primeiro semestre de 2009 em comparação com as mesmas negociações no mesmo período de 2008. A Nota revela que no primeiro semestre de 2009, 96% das negociações analisadas conquistaram pelo menos a reposição dos índices inflacionários acumulados até a data-base. O número é maior do que o alcançado no mesmo período de 2008, quando 89% das negociações salariais foram capazes de conquistar essa reposição.
Mas o percentual de negociações capazes de conquistar reajuste acima da inflação ficou praticamente inalterado. Se em 2008 o índice foi de 77%, em 2009 ficou em 78%. Todavia, das 100 negociações salariais acompanhadas, em 25 delas o aumento real acima da inflação ficou entre 0,01% até 0,5%, número superior ao de 2008, quando 15 negociações conquistaram esses índices. Também diminuiu o número de negociações capazes de conquistar aumentos reais entre 0,51% e 1,5% acima da inflação. O número que era de 41 negociações em 2008 caiu para 34 em 2009. Esses dados revelam que a conquista de aumentos reais quando ocorrem se dão em índices muito baixos e insuficientes para que os trabalhadores possam ampliar minimamente seu poder de consumo. Do mesmo modo, tem tornado difícil a elevação dos salários de maneira a conquistar reajustes que possam atenuar as perdas salariais causadas pela inflação até a negociação da próxima data-base.
Outra pesquisa também do Dieese, “Balanço dos pisos salariais negociados em 2008”, publicado em maio de 2009, analisou 628 pisos salariais registrados por seu Sistema de Acompanhamento de Salários (SAS). O resultado a que chegaram é o de que em 56% das unidades de negociação estudadas, o valor do piso salarial não ultrapassou 1,25 salário mínimo, ou R$ 518,75, se tomarmos por base o salário mínimo oficial vigente em dezembro de 2008, que era de R$ 415,00, e em 77% dos casos ele não ultrapassou 1,5 salário mínimo, ou R$ 622,50. Se compararmos com os três anos anteriores, constata-se que para 2005 o valor do piso salarial não ultrapassa 1,25 vezes o salário mínimo vigente em 26,3% das unidade de negociação analisadas e 50% para os pisos que não até 1,50 . Em 2006 essa proporção muda radicalmente. Os pisos salariais negociados em até 1,25 vezes o salário mínimo praticamente dobram, representando 50,7% das unidades de negociação. O mesmo crescimento se observa para as negociações com pisos até 1,5 vezes o salário mínimo oficial, que pulam para 72,6%. Em 2007 essa proporção cresce ainda mais, já que em 56,3% das unidades de negociação observadas o piso salarial ficou 1,25 vezes acima do salário mínimo e em 77,2% ficou 1,50 vezes acima do mínimo oficial. As notas metodológicas da pesquisa advertem que ficaram de fora as negociações dos trabalhadores do serviço público e os trabalhadores rurais.
A entidade destaca e de certo modo comemora que essa aproximação se deve à política de valorização do salário mínimo do governo Lula, que entre 2003 e 2009 reajustou o salário mínimo em 132,5%, enquanto o INPC-IBGE atingiu 60,4%, produzindo ganho real de 45%.
Contudo, mesmo com o aumento do salário mínimo oficial, se observarmos sua relação com o salário mínimo necessário calculado pelo próprio Dieese, a diferença média em 2008 foi de 4,89 vezes o que representa um crescimento se comparado a 2007, quando a relação foi 4,51 e com 2006 de 4,46 vezes. Os aumentos reais do salário mínimo, portanto, são insuficientes para acompanhar o salário mínimo necessário para o sustento de uma família proletária. Sem contar que o aumento do salário mínimo oficial poderia ser maior, se este não estivesse sob as injunções de uma política do governo federal que limita seus reajustes, pois o primeiro compromisso do Estado brasileiro é com os credores da dívida publica, esses parasitas que vivem da remuneração dos títulos públicos.
Ao relacionarmos as duas pesquisas aqui citadas, se verificam que essa aproximação dos pisos salariais com o salário mínimo oficial, se comparados com o crescimento na relação entre este e o salário mínimo necessário (4,89 vezes), bem como à difícil conquista de ganhos reais de salários acima da inflação, longe de representar uma aproximação positiva com o mínimo nominal, indica a crescente dificuldade dos trabalhadores em conquistarem aumentos reais de salário em suas datas-base. O crescimento das greves em 2008 e nesse início de 2009, em relação a 2007, é o sinal da insatisfação dos trabalhadores quanto às suas perdas salariais e a uma deterioração em suas condições de vida. Porém, o crescimento dessas mobilizações ainda é insuficiente para a conquista de aumentos reais de salário, o que acaba aproximando os pisos salariais negociados do salário mínimo oficial, que por sua vez mantém uma relação 4,89 vezes menor em relação ao salário mínimo necessário.
Os trabalhadores, portanto, ainda não tem muito que comemorar. Essa valorização do salário mínimo, saudada não só pelo Dieese, mas também pelo sindicalismo governista, é insuficiente em reverter o padrão de acumulação capitalista no Brasil. O aumento da diferença entre o salário mínimo oficial e o necessário (4,89 vezes) e o crescimento dos pisos salariais negociados próximos ao mínimo (56% não ultrapassou 1,25 salários mínimos e 77% até 1,50 salários mínimos), demonstram que o padrão de acumulação capitalista baseado na superexploração da força de trabalho, através do pagamento de salários baixíssimos incapazes de fazer frente ao custo de vida e à reprodução da força de trabalho em níveis minimamente decentes, se mantém como um elemento estrutural na relação capital-trabalho no Brasil.

Campinas, julho de 2009.

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