“O Hip Hop amadureceu tanto que apodreceu” (Dead Prez)
"Certa vez, um nobre homem, imaginou que os seres humanos se afogavam na água apenas por que estavam possuídos pela idéia de gravidade. Se afastassem essa representação da cabeça, por exemplo, esclarecendo-a como uma representação supersticiosa, religiosa, eles estariam livres de todo e qualquer perigo de afogamento. Durante toda a sua vida combateu a ilusão da gravidade, cujas danosas conseqüências todas as estatísticas lhe forneciam novas e numerosas provas Aquele nobre homem era do tipo dos novos filósofos revolucionários alemães.” Karl Marx
Muitos fazem uma leitura rasa sobre o Hip Hop, alguns de forma proposital, outros por falta de informação e certo grupo por opção política de direita, mesmo quando revestido por roupagem de esquerda. Qual a questão? Primeiramente ao descreverem como o Hip Hop chega ao Brasil não relacionam com o contexto histórico a nível nacional e internacional. Para ser mais preciso, falam do Hip Hop isolado de outras questões como simplesmente uma questão cultural em si. Quais as implicações?
Não entendem a trajetória do Hip Hop caindo assim em constatações imediatistas, errôneas, equivocadas, vazias, quando não vulgares.
Há possíveis análises sobre o Hip Hop, até mesmo porque o discurso eclético emanado do pós – modernismo, herdeiros de maio de 68, além de pregar o irracionalismo, também enfatizam a impossibilidade de se chegar a verdade, a compreensão do fenômeno analisado, do real, do mundo, logo a reflexão é deslocada para a percepção individual, para o subjetivismo egoísta onde todos os olhares são possíveis, desde que não parta das distas “condições materiais de produção e reprodução da vida”. Mas qual é a leitura que fazemos sobre o Hip Hop na nossa percepção enquanto classe oprimida?
A mesma leitura subjetivista que não ajuda entender nada.
Mencionando as mazelas que obstaculizam a compreensão de certo fenômeno social (no caso o Hip Hop), se quisermos fazer uma leitura na contra corrente, devemos salientar as seguintes problematizações: o Hip Hop chega ao Brasil na década de 1980, período da democratização, “transição feita pelo alto”, “transição transada”.
No primeiro momento como simples forma de entretenimento. Mas logo ganhou novo fôlego, principalmente pela sua proliferação nas periferias, tendo como principal sujeito a juventude preta, que até então estava na invisibilidade, já que o padrão de ser jovem estava associado à classe média dos movimentos estudantis que lutaram contra a ditadura, lembre – sem que lutar contra a ditadura não significa uma luta pela revolução. Essa juventude preta logo começou a questionar a violência policial e o racismo.
Um dos pontos forte que deu um caráter de movimento e organicidade ao hip hop foi a formação das posses. Essas posses estendiam sua atuação para além dos quatro elementos, podemos definir posse como a união de mc´s, b. boys, DJs e grafiteiros que se agrupavam em coletivos para divulgar o hip hop e realizar atividades comunitárias, intervenções nos bairros periféricos de reflexão por meio de palestras, debates, oficinas, seminários e outras formas de trabalho em espaços como escolas, associações e etc.
As posses possibilitaram novas formas de fazer trabalho politizado sem cair nos vícios do fazer política da época, novo por vim da juventude preta oprimida, que buscavam se organizarem fora das formas clássicas de organização do proletariado como os partidos políticos e sindicatos.
As posses logo se proliferaram nas periferias até a metade da década de 1990.
Entre o final da década de 80 e final da de 1990 foi marcado pela grande ascensão do hip hop ganhando expressão e se massificando, talvez podemos aqui citar como marco o CD dos Racionais mc´s “Sobrevivendo no inferno” que alcançou grande número de vendas, mas como nem tudo são flores e “para não dizer que não falei das rosas” não posso deixar de citar que o jovem movimento caiu nas graças da industria cultural de massas, do politicismo dos partidos políticos sobre tudo de esquerda e no canto da sereia do chamado “terceiro setor” e por fim do Capital, onde este tem o poder de transformar quase tudo ou tudo em mercadoria, logo o hip hop deve gerar lucro.
Assim, de ativistas muitos passaram a ser artistas, profissionais, músicos e outros adjetivos diversos, só que se esqueceu de avisá-los que aqui não é América do Norte, ou especificamente a terra do Tio San. Mesmo os que foram cooptados pelo Capital estão até hoje procurando o lucro, uns até mesmo de forma mais desesperada se expondo ao ridículo na televisão em diversos programas que historicamente vêem os pretos de forma estereotipada.
Um dos grandes méritos do Capital já analisado muito bem por Marx é a capacidade que este tem de transformar “tudo” em mercadoria, nunca é demais frisar.
Se pegarmos a história do Brasil veja que toda a expressão da cultura de matriz africana é marcada por conteúdo político de resistência, foi por meio dessas expressões que foram organizadas várias revoltas contestatórias. Qual foi a resposta do Estado? Primeiramente reprimiu essas manifestações de forma violenta sempre que teve a oportunidade, tentou esvaziar todo o conteúdo de resistência, e só depois o permitiu quando padronizadas, “enlatadas” e comercializadas sob o nome de elemento da cultura nacional e não mais de matriz africana.
Foi assim com a capoeira, com as danças africanas, com as religiões, com o samba e agora com o hip hop, todos podem fazer hip hop, inclusive brancos da classe média, só falta a polícia.
Isso chama-se projeto de embranquecimento, cujo o hip hop embarcou nesta esteira no começo da primeira década do século XXI.
Se para a classe trabalhadora as décadas de 1980 – 90 e a primeira década deste novo século foram perdidas, pra nós juventude preta oriundos da classe trabalhadora foram mais ainda, a derrota é esmagadora, pois não conseguimos nos organizarmos nas formas clássicas e quando construímos algo novo, damos de bandeja para o capital como o ocorrido com o movimento hip hop, hoje fora de combate no Brasil, ainda mais se tratando de um movimento que em curto espaço de tempo conseguiu alcançar os lugares mais distantes deste país onde nem mesmo a (pseudo) esquerda conseguiu chegar.
Resultado da derrota histórica vista por alguns como vitória: grande parte das posses viraram ONGs, outras foram cooptadas por ONGs que dizem manter o “protagonismo juvenil” (acrescente tutelado), inclusive reservando apenas um espaço de uma semana pra realização de semana de cultura hip hop capenga, rodeadas de patrocínios empresariais que não discute nada sério, mesmas lamentações e discurso de permanecia da sociedade vigente, veja bem, uma semana durante um ano esse é o espaço do hip hop?
Outras posses como que por osmose foram sugados por alguns partidos políticos, fazendo o jogo politicista da corrida por votos contra nós mesmo. Um mc já disse um dia que “trabalhando contra nós mesmos sempre sairemos derrotados”(GOG). Essas instituições (ONGs, Partidos, Estado, Capital), conseguiram tirar o potencial de resistência do hip hop o esvaziando inclusive com o aval de quem é adepto do hip hop.
Qualquer movimento social é por essência reformista já que surge de demandas imediatas, quando conquistada essa demanda eis a sua morte, tende a desaparecer, quando este movimento pode se manter? Quando passa da luta imediata, da “consciência comunitária” pra consciência de classe.
Mas a questão é que os movimentos caíram no discurso do “chamado terceiro setor”, inclusive o hip hop chegando neste momento viciado, onde tudo é projeto social, edital público pra se fazer algo, mais uma vez o Estado burguês não brinca em serviço, incorporando todos na instituição desde que seja pela manutenção desta ordem. E a luta?
Tem rappers que questionam: Qual luta? Racismo? Ainda existe isso? Violência policial? Tem policial mc. E assim novamente “a história se repete como farsa”.
Para concluir: pode um movimento emanado do lupen proletariado, desprovido das condições básicas de existência ser revolucionário?
Na nossa história recente parece que a resposta é não, contudo o hip hop no Brasil enquanto ferramenta de luta tinha todas as condições de fazer lutas mais significativas, o problema é que a luta acabou quando muitos quiseram ir pra TV, outros apenas gravar um medíocre CD e ainda tem a turma que acha que o hip hop é baladinhas, embora ainda existam pequenos focos de resistência espalhados pelo país que fazem trabalhos sérios, sons de protesto, mas que são sufocados pela idolatria da sociedade de consumo, de classes... Por tanto o hip hop continua em queda livre...
Não entendem a trajetória do Hip Hop caindo assim em constatações imediatistas, errôneas, equivocadas, vazias, quando não vulgares.
Há possíveis análises sobre o Hip Hop, até mesmo porque o discurso eclético emanado do pós – modernismo, herdeiros de maio de 68, além de pregar o irracionalismo, também enfatizam a impossibilidade de se chegar a verdade, a compreensão do fenômeno analisado, do real, do mundo, logo a reflexão é deslocada para a percepção individual, para o subjetivismo egoísta onde todos os olhares são possíveis, desde que não parta das distas “condições materiais de produção e reprodução da vida”. Mas qual é a leitura que fazemos sobre o Hip Hop na nossa percepção enquanto classe oprimida?
A mesma leitura subjetivista que não ajuda entender nada.
Mencionando as mazelas que obstaculizam a compreensão de certo fenômeno social (no caso o Hip Hop), se quisermos fazer uma leitura na contra corrente, devemos salientar as seguintes problematizações: o Hip Hop chega ao Brasil na década de 1980, período da democratização, “transição feita pelo alto”, “transição transada”.
No primeiro momento como simples forma de entretenimento. Mas logo ganhou novo fôlego, principalmente pela sua proliferação nas periferias, tendo como principal sujeito a juventude preta, que até então estava na invisibilidade, já que o padrão de ser jovem estava associado à classe média dos movimentos estudantis que lutaram contra a ditadura, lembre – sem que lutar contra a ditadura não significa uma luta pela revolução. Essa juventude preta logo começou a questionar a violência policial e o racismo.
Um dos pontos forte que deu um caráter de movimento e organicidade ao hip hop foi a formação das posses. Essas posses estendiam sua atuação para além dos quatro elementos, podemos definir posse como a união de mc´s, b. boys, DJs e grafiteiros que se agrupavam em coletivos para divulgar o hip hop e realizar atividades comunitárias, intervenções nos bairros periféricos de reflexão por meio de palestras, debates, oficinas, seminários e outras formas de trabalho em espaços como escolas, associações e etc.
As posses possibilitaram novas formas de fazer trabalho politizado sem cair nos vícios do fazer política da época, novo por vim da juventude preta oprimida, que buscavam se organizarem fora das formas clássicas de organização do proletariado como os partidos políticos e sindicatos.
As posses logo se proliferaram nas periferias até a metade da década de 1990.
Entre o final da década de 80 e final da de 1990 foi marcado pela grande ascensão do hip hop ganhando expressão e se massificando, talvez podemos aqui citar como marco o CD dos Racionais mc´s “Sobrevivendo no inferno” que alcançou grande número de vendas, mas como nem tudo são flores e “para não dizer que não falei das rosas” não posso deixar de citar que o jovem movimento caiu nas graças da industria cultural de massas, do politicismo dos partidos políticos sobre tudo de esquerda e no canto da sereia do chamado “terceiro setor” e por fim do Capital, onde este tem o poder de transformar quase tudo ou tudo em mercadoria, logo o hip hop deve gerar lucro.
Assim, de ativistas muitos passaram a ser artistas, profissionais, músicos e outros adjetivos diversos, só que se esqueceu de avisá-los que aqui não é América do Norte, ou especificamente a terra do Tio San. Mesmo os que foram cooptados pelo Capital estão até hoje procurando o lucro, uns até mesmo de forma mais desesperada se expondo ao ridículo na televisão em diversos programas que historicamente vêem os pretos de forma estereotipada.
Um dos grandes méritos do Capital já analisado muito bem por Marx é a capacidade que este tem de transformar “tudo” em mercadoria, nunca é demais frisar.
Se pegarmos a história do Brasil veja que toda a expressão da cultura de matriz africana é marcada por conteúdo político de resistência, foi por meio dessas expressões que foram organizadas várias revoltas contestatórias. Qual foi a resposta do Estado? Primeiramente reprimiu essas manifestações de forma violenta sempre que teve a oportunidade, tentou esvaziar todo o conteúdo de resistência, e só depois o permitiu quando padronizadas, “enlatadas” e comercializadas sob o nome de elemento da cultura nacional e não mais de matriz africana.
Foi assim com a capoeira, com as danças africanas, com as religiões, com o samba e agora com o hip hop, todos podem fazer hip hop, inclusive brancos da classe média, só falta a polícia.
Isso chama-se projeto de embranquecimento, cujo o hip hop embarcou nesta esteira no começo da primeira década do século XXI.
Se para a classe trabalhadora as décadas de 1980 – 90 e a primeira década deste novo século foram perdidas, pra nós juventude preta oriundos da classe trabalhadora foram mais ainda, a derrota é esmagadora, pois não conseguimos nos organizarmos nas formas clássicas e quando construímos algo novo, damos de bandeja para o capital como o ocorrido com o movimento hip hop, hoje fora de combate no Brasil, ainda mais se tratando de um movimento que em curto espaço de tempo conseguiu alcançar os lugares mais distantes deste país onde nem mesmo a (pseudo) esquerda conseguiu chegar.
Resultado da derrota histórica vista por alguns como vitória: grande parte das posses viraram ONGs, outras foram cooptadas por ONGs que dizem manter o “protagonismo juvenil” (acrescente tutelado), inclusive reservando apenas um espaço de uma semana pra realização de semana de cultura hip hop capenga, rodeadas de patrocínios empresariais que não discute nada sério, mesmas lamentações e discurso de permanecia da sociedade vigente, veja bem, uma semana durante um ano esse é o espaço do hip hop?
Outras posses como que por osmose foram sugados por alguns partidos políticos, fazendo o jogo politicista da corrida por votos contra nós mesmo. Um mc já disse um dia que “trabalhando contra nós mesmos sempre sairemos derrotados”(GOG). Essas instituições (ONGs, Partidos, Estado, Capital), conseguiram tirar o potencial de resistência do hip hop o esvaziando inclusive com o aval de quem é adepto do hip hop.
Qualquer movimento social é por essência reformista já que surge de demandas imediatas, quando conquistada essa demanda eis a sua morte, tende a desaparecer, quando este movimento pode se manter? Quando passa da luta imediata, da “consciência comunitária” pra consciência de classe.
Mas a questão é que os movimentos caíram no discurso do “chamado terceiro setor”, inclusive o hip hop chegando neste momento viciado, onde tudo é projeto social, edital público pra se fazer algo, mais uma vez o Estado burguês não brinca em serviço, incorporando todos na instituição desde que seja pela manutenção desta ordem. E a luta?
Tem rappers que questionam: Qual luta? Racismo? Ainda existe isso? Violência policial? Tem policial mc. E assim novamente “a história se repete como farsa”.
Para concluir: pode um movimento emanado do lupen proletariado, desprovido das condições básicas de existência ser revolucionário?
Na nossa história recente parece que a resposta é não, contudo o hip hop no Brasil enquanto ferramenta de luta tinha todas as condições de fazer lutas mais significativas, o problema é que a luta acabou quando muitos quiseram ir pra TV, outros apenas gravar um medíocre CD e ainda tem a turma que acha que o hip hop é baladinhas, embora ainda existam pequenos focos de resistência espalhados pelo país que fazem trabalhos sérios, sons de protesto, mas que são sufocados pela idolatria da sociedade de consumo, de classes... Por tanto o hip hop continua em queda livre...
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