06/10/2009

Bolívia: conjuntura às vésperas das eleições

Esta é uma pequena reflexão sobre a situação atual da Bolívia, feita as pressas, consultando só a memória e sem muita pretensão, porém espero que ajude os camaradas a refletirem sobre o processo que passa o país, e além disso que gere dúvidas, e que me enviem para que possamos refletir conjuntamente na melhor tradição comunista.
Abraços,
Denis Wolpert
Todas as pesquisas demonstram que o MAS, liderado pela dupla Morales e Linera, vai ganhar ainda mais espaço depois das eleições de 06 de dezembro. Até os jornais controlados pela oposição afirmam que Evo vai se reeleger com tantos votos quando do referendo revogatório, ou até mais, o MAS vai ganhar mais assentos para deputados e senadores, que resultará numa maioria absoluta no parlamento e o controle do Senado, que até então estava nas mãos da oposição e era o principal bastião de resistencia institucional da direita. Legal, tudo indica que o processo de 'cambio' vai se aprofundar. Fácil não?!
Não. A direita está rachada. Existem os burgueses que caminham pela negociação tentando seduzir a esquerda, para que está não vá muito longe, e dessa forma que eles tenham seu lugar ao Sol na nova ordem e existem aqueles que não querem negociar. Querem a guerra.
Os dois principais candidatos de oposição a Evo Morales representam bem essas oposições. Um candidato, Samuel Doria Medina, empresário, industrial, branco, dona da filial da rede de fastfood King Burguer na Bolívia (o povo aqui parece não gostar de MacDonalds, não vi nenhum até agora), dono de uma das maiores fábricas de cimento da Bolívia, entre outras coisas mais, representa a direita que tenta negociar, faz oposição, mas não parece querer 'rachar', está em terceiro lugar nas pesquisas e é duramente atacado pela direita 'linha-dura', o acusam de cumprir um papel para a esquerda, dando legitimidade ao jogo político institucional que está sendo guiado pelo MAS.
O outro é Manfred Reyes Villa, ex-capitão do Exército, estudou na famosa School of Americas, onde também foi formado Augusto Pinochet, tem a cara do deputado escravagista de Santos, Beto Mansur (na época do bigode) e fala agressiva. Depois de ser derrotado no referendo revogatório que o tirou do governo de Cochabamba conseguiu o feito de se tornar o principal líder de oposição, através do exercício de tensionamento político, e ao que parece vai exercitar ainda mais. Na época que era prefeito (governador, aqui as coisas são um pouco distintas) de Cochabamba, Manfred comprou 20 carros para o governo, e mandou blindar todos eles, para contextualizar os brasileiros: aqui não é São Paulo, nem Rio de Janeiro no quesito violência urbana. Não acontecem assaltos a mão armada nem com metade da freqüência que acontecem no Brasil (detalhe que com toda violência que existe no Brasil os governadores não mandam blindar os carros públicos). O que será que Manfred estava prevendo quando comprou carros blindados? Bem, além disso Manfred escolheu como seu candidato a vice Leopoldo Fernandez, ex-governador de Pando, que está numa penitenciaria por ter sido responsável pela morte de dezenas de campesinos nos conflitos de setembro de 2008, no qual os departamentos da "meia-lua" (Pando, Beni, Santa Cruz, Chuquisaca) queriam se separar do resto da Bolívia. A escolha de Manfred demonstra o caminho que ele pretende seguir: confrontação e violência.
Enquanto isso diversos pequenos grupos de direita se organizam. No começo do ano o governo desbaratou um grupo internacional, paramilitar, terrorista, de extrema-direita, armado até os dentes, que estavam em Santa Cruz, o líder do grupo Eduardo Rozsa Flores, hungaro-boliviano, lutou na guerra da Bósnia, antes de vir a Bolívia deu uma entrevista em seu país dizendo que vinha para libertar Santa Cruz, eliminar o perigo comunista, e que a entrevista só era para ser publicada se ele fosse bem sucedido ou morto. Como ele foi morto, a entrevista foi publicada, e assim descobriu-se que estavam preparando um exército irregular de cerca de 1000 pessoas para lutar pela 'libertação' de Santa Cruz. Além disso, grupos como a Falange Socialista Boliviana, de matiz fascista voltou a se organizar, assim como alguns pequenos grupos de neonazistas, que juntos com a União da Juventude Cruceña, passam a formar uma espécie de tropa de choque da direita para futuros confrontos. A diferença de pequenos grupos radicais de direita e pequenos grupos radicais de esquerda, é que a direita costuma ter recursos, muitos recursos, e acessos, acessos a pessoas grandes e influentes, como comandantes da polícia, oficiais das forças armadas, entre outros, o que torna a situação perigosa.
Um ponto final a ser levado em consideração é que os 'originários' da Bolívia, apesar de terem uma índole bastante rebelde parecem avessos ao modo de guerrear dos europeus, um indício disso é que foram derrotados em todas as guerras que travaram até hoje e que não parecem dominar ferramentas básicas da guerra como a ordem unida e a disciplina. Em contrapartida, a maioria dos grupos de direita são encabeçados por pessoas de direita que deixaram o leste europeu devido ao socialismo. E os povos do leste europeu costumam saber guerrear. E aqui parece que a direita leva isso em conta ao analisar a correlação de forças: existe um acumulo, uma experiência militar; existem recursos (eles ainda detém o poder econômico); existe apoio no plano internacional (alguém tem dúvidas que se eles precisarem, os EUA, Israel, Taiwan, Colômbia, Peru e cia ltda, ajudam) isso é eles tem crédito para comprar armamentos, pronta entrega e pontualidade na entrega (cai de pára-quedas no dia seguinte ao pedido), treinamento para o uso, e tudo aquilo que a gente vê passar em estados conflagrados ou que vimos no passado.
Vejam, esse ultimo ponto é só para reforçar que existe sim uma possibilidade grande de estourar o barril aqui na Bolívia, e que a meu ver, a direita está se preparando para isso. Se a esquerda vai estar preparada para fazer frente, essa é outra história.
PS.: Os grupos de esquerda não estão se preparando para esse 'combate', se apóiam no fato que o MAS tem a lealdade das forças armadas... bem, Salvador Allende também acreditava em Pinochet... além disso, que esperar de um Exército no qual a maioria de seus altos oficiais estudaram nos Estados Unidos devido a quantidade de anos sob alta influência norte-americana? E o Evo não para de comprar armas para eles...
Denos Wolpert é militante do PCB de São Paulo

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